Conflito de dados entre sistemas é alvo de reclamação de gestores do
programa no país inteiro. Ministério reconhece problema e diz que tenta
achar solução
Enquanto mais de 2 mil políticos foram flagrados recebendo o Bolsa Família no
início do ano, várias famílias pobres que têm direito de participar do
programa tiveram benefícios bloqueados ou cancelados em função de falhas
ou conflitos cadastrais de dois sistemas de informática do governo
federal. Gestores do programa em sete Estados ouvidos pelo iG estimam que entre 2% e 5% dos beneficiários sofrem com esse problema.
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Hoje, para receber o Bolsa Família, o beneficiário é inscrito em dois
sistemas. O primeiro é o Cadastro Único para Programas Sociais do
Governo Federal (Cadúnico), onde estão informações como identificação da
família, renda, endereço, entre outras. O segundo é o Sistema de
Benefícios ao Cidadão (Sibec), gerido pela Caixa Econômica Federal. Este
último é responsável pela geração da folha de pagamento do Bolsa
Família.
Os gestores do Bolsa Família reclamam que, pelo fato dos dois sistemas
não serem diretamente interligados, qualquer alteração feita em um dos
dois (como uma simples atualização cadastral), se reflete diretamente no
bloqueio de benefícios. É como se um sistema enxergasse um erro ou
incongruência no outro, bloqueando automaticamente o pagamento dos
benefícios mesmo para pessoas que não apresentam qualquer tipo de
problema ou irregularidade.
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Por exemplo, há casos em que, no ato de cadastro no Cadúnico, o sistema
aponta renda compatível com o programa BolsaFamília, mas o Sibec refaz
os cálculos baseado em outros critérios e, muitas vezes, o benefício é
cancelado por a renda ficar superior à permitida para o programa.
Gestores também contam que, em outras situações, os dados de
beneficiários são apagados dos sistemas do governo federal sem qualquer
motivo aparente.
Outro problema constante diz respeito à transferência de domicílio. O
Cadúnico e o Sibec têm cancelado benefícios de pessoas que mudam de
cidade, mesmo não tendo melhorado de renda. Em lista recebida pela iG ,
pelo menos 20 falhas nos sistemas Cadúnico e Sibec são apontadas como
causas de bloqueios ou cancelamentos indevidos de benefícios.
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O Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) reconhece as falhas nos
sistemas do Bolsa Família, mas não confirma o volume de benefícios
bloqueados indevidamente por esse problema. Em agosto, o MDS alertou que
1,6 milhão de famílias correm o risco de terem seus benefícios
oficialmente cancelados no início de 2014 por falta de atualização
cadastral.
Demora nos ajustes
Em Imaculada, cidade distante 376 quilômetros de João Pessoa, na
Paraíba, uma mãe deixou de receber os R$ 140 mensais do programa após
uma atualização cadastral no Cadúnico, há aproximadamente um ano. No
caso dela, automaticamente, o sistema gerou um novo número de
identificação de usuário, que não foi reconhecido pelo Sibec. O
resultado foi o cancelamento do benefício. Mesmo depois de tentar
reverter o processo, após conclusão da apuração das falhas em setembro,
ela não recebeu uma resposta do governo federal.
Outro exemplo está em Curitiba, no Paraná, onde gestores enfrentam
problemas com divergências entre informações de certidões de nascimento e
de casamento dos responsáveis pelas famílias. “Quem recebe o Bolsa
Família não tem como esperar. Muitas vezes, levamos dois ou três meses
para resolver um problema pontual do programa. Na prática, quem escuta
diretamente as reclamações são os gestores”, descreve um gestor que
pediu para não se identificar.
“Ressaltamos a importância do Programa Bolsa Família para amenizar a
pobreza no nosso País, mas discordamos com a forma como o governo
federal e a Caixa Econômica gerenciam seus sistemas”, revela outro
gestor, que também não quis se identificar.
A instabilidade dos sistemas também incomoda quem gerencia o programa
nos diferentes estados. Eles afirmam que, mesmo após contatos
telefônicos com a coordenação do programa ou por meio dos chamados
formulário-padrão de gestão de benefícios (uma espécie de reclamação
formal encaminhada diretamente ao MDS), falhas persistem.
Em nota oficial, o MDS e a Caixa Econômica afirmaram que trabalham na
solução desses problemas desde o ano passado. “A solução definitiva
somente ocorrerá quando for finalizado o desenvolvimento, pela Caixa, de
um novo Sistema de Benefícios. Até lá, estão sendo feitos ajustes no
sistema atual para minimizar o problema”, informou o MDS.
O difícil começo
A dificuldade de entrar no programa e receber o benefício pela primeira
vez é outra lamentação de quem recorre ao benefício. Alguns esperam até
um ano para receber o dinheiro da bolsa pela primeira vez. Outros, mesmo
em situação de extrema miséria, nem conseguem se cadastrar.
Francisco Xavier Nascimento, pedreiro de 46 anos, tem seis filhos.
Natural de Valparaíso, em Goiás, mora em um barraco humilde na
comunidade Sol Nascente, favela de 80 mil moradores, distante 30
quilômetros do centro da capital federal.
O pedreiro sobrevive apenas de bicos e tenta obter o benefício para pelo
menos um de seus seis filhos. Três deles estão em idade escolar. “Tem
gente que nem deveria receber, mas recebe. Eu acho injusto”, diz.
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